O que podemos fazer um pelo o outro?
E não é que o homem tropeçou, “catou cavaca” e meteu a cara no chão. Eu ainda olhei para trás e reparei que havia um buraco na calçada. Voltei com meus olhos e fui acudir o cara. Ele deve ter ficado uns 30 segundos com a cara na calçada, talvez por vergonha ou por não conseguir levantar. Não importa, eu fui até o cara e estendi a mão. Aquela mão áspera e parda pegou na minha e fiz certa força para deixá-lo sentado. Limpei o rosto do homem e ele apontou para o buraco, eu havia imaginado. Ele estava meio zonzo e não é fácil tomar um puta tombo na Almirante Barroso no Centro do Rio. A multidão ri ou simplesmente passa por cima de você. Mas eu fiquei comovido e bati um papo com o cara que ainda não conseguia ficar de pé. Logo em frente do local onde estávamos, havia um botequim e rapidamente fui comprar uma garrafinha d’água para aquele. Fui em um pé e voltei no outro. As pessoas continuavam rindo, as outras passando, o guarda apitando, o sol queimando e eu me esforçando. Ele bebeu a água e eu estava preocupado em possíveis fraturas. Ele havia machucado os lábios e tinha algumas escoriações nos braços e a calça tinha um rasgo. Eu senti uma pena e ninguém me ajudou.
Consegui coloca-lo de pé depois de uns 10min. Ele apenas tinha sofrido um pequeno susto, mas estava se recuperando. Eu insisti para ele ir até o Souza Aguiar (hospital) comigo, mas ele dizia que estava melhor e que não havia necessidade. Fiz questão de levá-lo à farmácia e comprei alguns medicamentos para fazer um curativo. Ele já estava bem melhor, mas o calor do Rio não dava trégua e nós suávamos demais. Fiz o curativo ainda na porta da farmácia e perguntei para onde ele estava indo. Ele sorriu e disse que estava indo para o trabalho e que o turno dele estava para começar. Meu Deus! Não podia deixar aquele homem ali e ir embora. Não podia virar as costas e sair. Fiz um sinal para o táxi e ele não queria entrar de jeito maneira. Parecia uma mula empacada, mas convenci que era melhor ele tomar o táxi para não perder o expediente. O táxi estava de porta aberta e ele me deu um longo abraço. Apertou-me e disse palavras bonitas e começou a entrar no carro. Eu deixei um dinheiro com ele e instruí ao motorista para levá-lo onde ele pedisse. O homem havia aberto o vidro traseiro do táxi e disse que quando eu precisasse de qualquer coisa eu poderia procurá-lo. Eu sorria encabulado. Então ele afirmou:
- Mano, estamos juntos. Eu trabalho no cemitério do caju. Sou responsável pela manutenção dos túmulos, gavetas, sepulturas e tudo mais. Se você precisar, ou sua família, por favor, me procure que já é! Eu fiquei fixo. E ele ainda falou:
- Não esqueça. Precisando é só chegar na parada. Dou um jeito e você não paga nada, nem sua família. Você é sangue e estamos aí.
O motorista arrancou com o carro e eu fiquei olhando o cara me dar tchau pelo vidro de trás do táxi.
Saí resmungando... Porra, fiz minha parte. Sou cidadão e quero ajudar as pessoas, mas daí me oferecer préstimos funerais pra mim... vai pra porra e pra puta que te pariu...
E saí andando e imaginando... Como vou procurá-lo se eu precisar?
Eu hein!
(contos – Alexandre Hallais)
E não é que o homem tropeçou, “catou cavaca” e meteu a cara no chão. Eu ainda olhei para trás e reparei que havia um buraco na calçada. Voltei com meus olhos e fui acudir o cara. Ele deve ter ficado uns 30 segundos com a cara na calçada, talvez por vergonha ou por não conseguir levantar. Não importa, eu fui até o cara e estendi a mão. Aquela mão áspera e parda pegou na minha e fiz certa força para deixá-lo sentado. Limpei o rosto do homem e ele apontou para o buraco, eu havia imaginado. Ele estava meio zonzo e não é fácil tomar um puta tombo na Almirante Barroso no Centro do Rio. A multidão ri ou simplesmente passa por cima de você. Mas eu fiquei comovido e bati um papo com o cara que ainda não conseguia ficar de pé. Logo em frente do local onde estávamos, havia um botequim e rapidamente fui comprar uma garrafinha d’água para aquele. Fui em um pé e voltei no outro. As pessoas continuavam rindo, as outras passando, o guarda apitando, o sol queimando e eu me esforçando. Ele bebeu a água e eu estava preocupado em possíveis fraturas. Ele havia machucado os lábios e tinha algumas escoriações nos braços e a calça tinha um rasgo. Eu senti uma pena e ninguém me ajudou.
Consegui coloca-lo de pé depois de uns 10min. Ele apenas tinha sofrido um pequeno susto, mas estava se recuperando. Eu insisti para ele ir até o Souza Aguiar (hospital) comigo, mas ele dizia que estava melhor e que não havia necessidade. Fiz questão de levá-lo à farmácia e comprei alguns medicamentos para fazer um curativo. Ele já estava bem melhor, mas o calor do Rio não dava trégua e nós suávamos demais. Fiz o curativo ainda na porta da farmácia e perguntei para onde ele estava indo. Ele sorriu e disse que estava indo para o trabalho e que o turno dele estava para começar. Meu Deus! Não podia deixar aquele homem ali e ir embora. Não podia virar as costas e sair. Fiz um sinal para o táxi e ele não queria entrar de jeito maneira. Parecia uma mula empacada, mas convenci que era melhor ele tomar o táxi para não perder o expediente. O táxi estava de porta aberta e ele me deu um longo abraço. Apertou-me e disse palavras bonitas e começou a entrar no carro. Eu deixei um dinheiro com ele e instruí ao motorista para levá-lo onde ele pedisse. O homem havia aberto o vidro traseiro do táxi e disse que quando eu precisasse de qualquer coisa eu poderia procurá-lo. Eu sorria encabulado. Então ele afirmou:
- Mano, estamos juntos. Eu trabalho no cemitério do caju. Sou responsável pela manutenção dos túmulos, gavetas, sepulturas e tudo mais. Se você precisar, ou sua família, por favor, me procure que já é! Eu fiquei fixo. E ele ainda falou:
- Não esqueça. Precisando é só chegar na parada. Dou um jeito e você não paga nada, nem sua família. Você é sangue e estamos aí.
O motorista arrancou com o carro e eu fiquei olhando o cara me dar tchau pelo vidro de trás do táxi.
Saí resmungando... Porra, fiz minha parte. Sou cidadão e quero ajudar as pessoas, mas daí me oferecer préstimos funerais pra mim... vai pra porra e pra puta que te pariu...
E saí andando e imaginando... Como vou procurá-lo se eu precisar?
Eu hein!
(contos – Alexandre Hallais)
7 comentários:
O que podemos fazer um pelo outro?
às vezes estender a mão e ajudar a levantar, outras, simplesmente ouvir, ou até acompanhar o silêncio.
Ele poderia ter ficado no obrigado, mas se prestou a oferecer o que mais tinha de "valor": seu trabalho.
Espero sinceramente que demore a necessitar daqueles préstimos.
Bjo
Ah Alexandre, ótimo esse conto! Esse humor sarcástico me fascina. Até as rimas saíram musicando seu conto, ficou maravilhoso.
Quanto à vida! Ah... eu ainda tenho que aprender a mergulhar sem ter medo de me afogar.
:)
abraços! amo o que tu escreve!
Lindo esse conto!
E quanto ao final, achei interessante.
Acredito que ele não teria dito por mal, ele apenas ofereceu aquilo que ele tinha. Era a única forma que ele poderia retribuir a ajuda.
Muito lindo! Gostei bastante, viu?
Ah! Saudade de tu! De conversar contigo e de saber como estas... Culpa dessa vida corrida que nunca nos ajuda, né?
Beijão,
Kari
Meu querido amigo... essa é a vida... tragicômica... mais tenha em mente sempre vale a intenção de ajudar o próximo... "fazer o bem sem ver a quem"... Saudades!!!
beijos!!!
Krika
KKKK.Inusitado do começo ao fim.Eu fiquei pensando eqt lia que com tudo vc ainda tinha tirado uma foto.
Como vc não tem OUTROS no seu coemnts vou suar o meu blogspot
hehe...
história legal, não é todo mundo que tem uma disposição dessas!
Que desfecho imprevisível heim? rs...
Bah, irmão!
Ninguém merece essa gratidão. Tu ajuda o cara e o cara te devolve isso. Mas adorei o que colocastes! Lembrei de minhas caminhadas aqui pelo centro de Poa, e não só pelo centro, mas por todos os cantos aonde ando, encontro pessoas nestes estados. Fico olhando e não faço nada, mas penso: Por que eles estão neste estado? Será que seus queridos filhos os abandonaram? O que houve?
Esse mundo é totalmente desumano, que se por acaso tu ajudares uma pessoa destas(mendiga), eles ficam te olhando e riem na tua cara. É triste o cinismo dessas criaturas.
Abs e bom finde irmão!!!
Marcos Ster
Postar um comentário